Por maioria, a SDI-1 entendeu que os motivos econômicos apresentados pela empresa não se sobrepõem a outros valores.
A
Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal
Superior do Trabalho, em sua composição plena, confirmou a decisão em
que a Sétima Turma havia considerado discriminatória a dispensa de um
executivo da Pepsico do Brasil Ltda. após ser diagnosticado com câncer
de próstata. Por dez votos a três, a SDI decidiu aplicar ao caso a Súmula 443,
que presume discriminatória a despedida de empregado portador do vírus
HIV ou de doença grave que suscite estigma ou preconceito.
Profissional exemplar
Na
reclamação trabalhista, o executivo disse que havia trabalhado 28 anos
na empresa e era tido como profissional exemplar, com alto índice de
produtividade. O diagnóstico de neoplasia prostática ocorreu em 2012,
mas seus exames já mostravam a evolução dos índices de PSA desde 2003.
Ele declarou que sempre manteve a Pepsico ciente de sua situação de
saúde, pois relatava os acompanhamentos médicos e comunicava as medidas
recomendadas. Todavia, sustentou que, cinco meses após a constatação do
câncer, quando estava prestes a ser promovido a diretor, a empresa o
dispensou.
Em defesa, a Pepsico
disse que a demissão tinha sido motivada pela necessidade de cortar
gastos e alcançar mais lucros, procedimento, segunda a empresa, “típico
no sistema capitalista”.
Discriminação
O
juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região
(PR) haviam julgado improcedente o pedido do executivo de indenização
por dano moral e de reintegração ao emprego. No julgamento de recurso de
revista, porém, a Sétima Turma do TST considerou que a Pepsico não
havia apresentado elementos que afastassem a presunção de discriminação,
pois não havia explicitado por que o perfil profissional do executivo
não seria compatível com a nova orientação da empresa. Com esse
entendimento,condenou a Pepsico a reintegrar o executivo, com o
pagamento da remuneração devida durante o período de afastamento, ou a
pagar indenização correspondente ao dobro da remuneração relativa ao
período compreendido entre a dispensa e a decisão. Deferiu, ainda,
indenização por danos morais ao empregado no valor de R$200 mil.
Divergências
Nos
embargos à SDI-1, órgão responsável pela uniformização da
jurisprudência do TST, a empresa sustentou que há “ampla divergência
jurisprudencial” sobre a matéria e que a decisão da Sétima Turma diverge
do entendimento consolidado de outras Turmas do Tribunal. Num dos
precedentes citados, a Oitava Turma do TST entende que o câncer, por si
só, não tem natureza contagiosa nem manifestação externa que gere
aversão.
Em outro, a Sexta Turma condenou a Souza Cruz S.A. a reintegrar um
auxiliar administrativo portador de neoplasia maligna nos rins.
Segundo
a empresa, a Súmula 443 busca erradicar comportamentos discriminatórios
em caso de doença estigmatizante – que, de acordo com a argumentação,
não se confunde com doença grave. “O estigma é fardo de natureza social
que opera gerando desigualdades desarrazoadas, preconceituosas e,
portanto, juridicamente vedadas, o que não é o caso dos autos”,
sustentou.
Relator
O
relator dos embargos da empresa, ministro Márcio Eurico Vitral Amaro,
afastou em seu voto a tese de que o profissional teria sido
estigmatizado pela doença e a aplicação da Súmula 443 ao caso. Para ele,
embora grave, a neoplasia de próstata não se insere no conceito de
doença que suscite estigma ou preconceito. “A moléstia não oferece risco
de contágio nem apresenta manifestação externa que gere aversão ou que
marque o homem de forma negativa e indelével”, afirmou. O ministro disse
ainda que nunca viu um portador de câncer de próstata ser discriminado.
“A maioria sobrevive”, acrescentou.
O voto do relator foi seguido pelos ministros Breno Medeiros e Alexandre Ramos.
Dignidade
Prevaleceu,
no entanto, o voto divergente do ministro Cláudio Brandão, relator
também do recurso de revista na Sétima Turma, para quem a presença do
câncer gera a presunção de que a pessoa pode ser diferenciada no meio
social, causa estigma e gera até mesmo sensibilidade social. O ministro
ressaltou que a prova de que a dispensa não havia sido discriminatória
ou motivada por preconceito é do empregador, mas isso não ocorreu.
Na
divergência, o ministro afirmou que os fundamentos exclusivamente
econômicos adotados pelo TRT, como contratar empregados com salário
menor, a fim de reduzir os custos e aumentar os lucros, não se sobrepõem
a outros valores, como a função social da empresa, a valorização do
trabalho e a dignidade da pessoa humana, “num contexto em que o
empregado dedicou quase 28 anos de sua vida profissional à empresa”.
Na
avaliação do ministro Lelio Bentes Corrêa, o paciente com câncer passa a
ser percebido no mundo do trabalho como um problema, pois pode não mais
produzir como antes. O ministro Renato de Lacerda Paiva, que também
votou com a divergência, contestou as razões econômicas da empresa para a
demissão. “Não é justificativa”, disse. Para o ministro, só quem já
teve câncer ou está em tratamento é que pode dizer. “E eu lhes garanto,
há discriminação”, concluiu.
Processo: E-ED-RR-68-29.2014.5.09.0245
(Fonte: Assessoria de Comunicação Social - Tribunal Superior do Trabalho)
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